quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Cruzeiros em Fernando de Noronha - ameaça ao ecoturismo?

Ambientes naturais possuem um equilíbrio próprio que deve ser levado em conta no planejamento dos fluxos turísticos e sob pena de prejuízos, muitas vezes irreversíveis, torna-se necessário impor limites às atividades humanas.

De modo geral, na tentativa de estabelecer limites, a administração das áreas de preservação sujeitas à visitação estabelecem restrições que incluem horários, locais específicos para acampamentos e, claro, quantidade de visitantes.

Um dos mais belos ambientes naturais de nosso país é o Arquipélago de Fernando de Noronha, classificado como Área de Preservação Ambiental (APA), criada pelo Decreto no 92.755, de 05 de junho de 1986. De acordo com seu Plano de Manejo, "apresenta alta produtividade e diversidade biológica, sendo área de extrema importância para a manutenção das comunidades locais, assim como uma das localidades de maior relevância do Atlântico Sul para descanso, reprodução e alimentação de espécies migratórias, tanto neárticas (América do Norte), quanto aleárticas (Europa, Ásia e norte da África)". Desde 2001, é reconhecido e tombado pela UNESCO como patrimônio mundial da humanidade



É claro que um destino com estas particularidades deve ser objeto de restrições. Não se trata de vetar pura e simplesmente, mas adotar o clássico conceito da sustentabilidade, como definido pelo Relatório Bruntland: "Desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento capaz de suprir as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade de atender as necessidades das futuras gerações", ou nas palavras de Beatriz Accioly "Preservar a natureza é garantir que nossos netos possam desfrutar de paraísos como Noronha..."

Todo esse conceitual é bonito na teoria, mas difícil de ser aplicado, principalmente em um país onde muitos vivem como se os recursos naturais fossem inesgotáveis e a atuação dos órgãos ambientais sofre com dificuldades de toda ordem - desde marcos legais adequados (como termos de referência para estudos ambientais), até falta de pessoal qualificado para fiscalização e orientação.

No caso específico dos cruzeiros marítimos, em contraponto aos benefícios comerciais trazidos pelos turistas que desembarcam na ilha, os impactos ambientais adversos decorrentes incluem (em situações normais ou acidentais):

Navios
- Despejo de água de lastro, que pode inserir espécies exógenas no ecossistema
- Despejo de efluentes sanitários
- Derrame de óleo
- Ruído
- Emissões decorrentes do consumo de combustível

Turistas
- Geração de lixo
- Danos à vegetação e à fauna
- Consumo de água e energia

A questão se agrava não apenas pelo impacto em si, mas por sua magnitude. De um navio de cruzeiro, desembarcam em torno de 600 pessoas em Fernando de Noronha - um grande aumento em curto espaço de tempo, típico do turismo de massa. O que leva a uma conclusão que li no texto de Alice Watson: "Para sustentar o turismo crescente, Fernando de Noronha se desenvolve sacrificando, paradoxalmente, seu principal atrativo turístico: os recursos naturais"

Visitamos Fernando de Noronha pela primeira vez ao final de 1993. Naquela época, a pouca infra-estrutura reduzia o conforto, mas a sensação de contato com a natureza - o verdadeiro ecoturismo - era bem maior que em 2007, quando voltamos, reflexo (inevitável?) do crescimento no turismo.

Há soluções viáveis? claro que sim. Um combinação de regras claras e justas (incluindo principalmente a limitação do número de passageiros em cada cruzeiro), aliadas a uma fiscalização rigorosa e ações de educação para o turismo sustentável são os ingredientes necessários. Há recursos e meios para isso, mas o poder público precisa adotar a prioridade que a situação requer.

Do lado dos agentes turísticos, é preciso lembrar que associar sua marca a práticas ambientalmente incorretas é um verdadeiro tiro no pé, em tempos onde o mercado e a sociedade tem se preocupado com a sustentabilidade.

Por fim, uma parcela importante da responsabilidade recai sobre os turistas, afinal, sem demanda não há fluxo turístico para um destino. Pode ser mais barato viajar em cruzeiros, mas a experiência vai compensar? haverá aquele momento de contemplação silenciosa das paisagens únicas da ilha? Isso não é necessário? Bom, talvez essa não seja sua praia então....

Alguns textos anteriores:

- Fernando de Noronha, o paraíso ameaçado
- Cruzeiro em Noronha: precisa?
- CPRH volta a licenciar cruzeiro em Noronha

O que outros blogs escreveram sobre o tema, nesta 2a. edição do #TurismoEmDebate:


Andarilhos do Mundo Cruzeiros em Noronha - #TurismoEmDebate
Dicas & Turismo Cruzeiros em Fernando de Noronha?
Eu Vou de Mochila Cruzeiros em Fernando de Noronha, pra quê?
Trilhas e Aventuras Cruzeiros em Fernando de Noronha? Sim ou Não?
Viajar é tudo de bom O que vai ser de Noronha depois dessa temporada de Cruzeiros?

4 comentários:

  1. Não conhecemos Fernando de Noronha, temos vontade de ir até lá conferir e agora, depois de sua postagem, vamos ver e fotografar com outro olhar.

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    1. É isso aí Walter. Fernando de Noronha tem que ser "descoberta" por quem a visita e isso não combina nem um pouco com turismo de massa. Abraço.

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  2. Navios em Noronha seguem as regras da Marpol. Não há troca da água de lastro, não há derramamento de óleo, esgoto ou qualquer tipo de efluente. Todos os resíduos do navio são tratados de forma correta, não há consumo de água e energia - recursos escassos em Noronha. Os turistas pouco consomem alimentos, gerando poucos resíduos na ilha. Fazem refeições no navio, pois é All Inclusive e os resíduos ficam lá até chegar ao Porto de Recife. Nas pousadas, as pessoas consomem água - bem escassa, gerando então esgoto! energia - a óleo diesel. Todos os resíduos que o turista produz ficam na ilha, gerando um grande problema. Quer saber mais? Procure a CPRH ou a Marinha e procure ler o Estudo Ambiental dos Cruzeiros em Noronha publicado em julho de 2012. Ok!!!

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